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21/02/2019 às 09h17m - Atualizado em 21/02/2019 às 09h26m

Pernambuco: Aos 48 anos, estudante da EJA é aprovado em Matemática na UFPE

João Batista Santos concluiu os estudos em 2018 na EREM Arnaldo Assunção, pela modalidade Educação de Jovens e Adultos

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“Dê-me uma alavanca e um ponto de apoio e levantarei o mundo”. A frase é do matemático Arquimedes, e faz muito sentido na vida do auxiliar de serviços gerais João Batista Santos, de 48 anos, que fez da escola objeto de apoio e impulso para guinar na vida após duas décadas sem estudar. João é exemplo de superação em dose dupla na cidade de Caruaru, Agreste do Estado, onde mora com a família: além da idade e das responsabilidades como pai e provedor da casa, o agora universitário tem baixa visão.

João nasceu no Salgado, um bairro periférico e o maior da cidade. Seus pais, agricultores, criaram os nove filhos com dificuldades, mas todos tiveram a oportunidade de estudar. Sua relação com a EREM Arnaldo Assunção começou desde cedo. Foi lá onde João iniciou os estudos e concluiu a quarta série. De lá, seguiu para a EREM Padre Zacarias Tavares, e interrompeu a sua vida escolar aos 17 anos, no primeiro ano do Ensino Médio. Os motivos foram muitos. Um deles foi a necessidade de trabalhar para ajudar no sustento da casa.

“Foi aí que comecei a trabalhar de padeiro. Eu pegava muito cedo na padaria, ainda de madrugada, e só largava à noite. Depois de um tempo, eu casei, tive quatro filhos, não conseguia mais acompanhar o ritmo dos estudos e nem tinha pretensão de voltar”, conta. João criou seus filhos com o baixo salário que recebia, mas em 2016 decidiu voltar à sala de aula. Dessa vez, queria fazer um curso técnico, porém foi surpreendido pela exigência da ficha 19 no ato da matrícula. “Eu queria uma melhoria de vida para a minha família, então não pensei duas vezes: me matriculei na EJA (Educação de Jovens e Adultos) da EREM Arnaldo Assunção e recomecei minha vida de estudante”, detalhou.

A vontade de ter uma profissão fez João recalcular a sua rotina. Ele chegava às 5h no trabalho, largava às 18h, passava em casa para jantar, e seguia para a escola e terminava suas obrigações às 22h. Por dia, ele dormia pouco mais de seis horas. O cansaço físico e mental batia na porta, mas crescer estava como prioridade para quem perdeu muito tempo parado no mesmo lugar. “A gente se acomoda. Acha que aquele salário basta, que não tem mais idade pra pensar em futuro, carreira. Eu pensei muito nisso, mas algo aqui dentro dizia para seguir meu sonho de ter uma profissão. Foi muito difícil essa volta. A cabeça parecia que estava parada, sabe? Nada entrava. Foram 28 anos sem entrar numa sala de aula. Mas, aos poucos, a mente foi se abrindo”.

Além da nostalgia de retornar à escola que frequentou ainda criança, João teve outra surpresa que soa mais como destino: o seu professor de matemática na infância, Osvaldo Brito, voltaria a lhe dar aulas no EJA. “Eu lembrava muito dele porque sempre gostei de matemática. Sempre gostei das aulas dele e, para mim, foi uma surpresa muito boa. Me senti em casa duas vezes”, brincou.

Com o passar das aulas, a relação aluno/professor foi se estreitando e se tornou uma amizade das boas, daquelas que encorajam. “Ele acreditava em mim, entende? Sempre dizia que eu era capaz de fazer mais que um curso técnico, e me incentivou a fazer o ENEM, assim como meus filhos e minha esposa”. Em 2017, João fez seu primeiro vestibular. “Não passei. Fiquei muito desanimado, mas a escola me deu todo o suporte para que eu não desistisse”. No ano seguinte, João finalmente recebeu a notícia de que passou em Matemática na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

“Eu ainda não acredito. É um sonho mesmo. É uma bênção. Tudo acontece no tempo de Deus. Eu parei, mas quando voltei, as portas se abriram. A vontade de fazer matemática foi maior. Muitas vezes eu tive medo de não conseguir, a minha visão dificultou mais ainda, mas hoje eu estou aqui, um universitário. Se eu tive capacidade de chegar até aqui, tenho capacidade de concluir esse curso e conciliar com o meu novo trabalho. Estou preparado de corpo e alma. Não desisti dos meus sonhos e hoje colho os frutos”.

Após a entrevista, a nossa equipe acompanhou o primeiro dia de aula de João na universidade. Visivelmente ansioso, o estudante entrou na sala lotada de calouros, desejou boa noite aos colegas de turma, se apresentou e sentou no primeiro lugar da fila. “O lugar certo, na hora certa”, disse baixinho, com os olhos marejados.

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